Vivemos em um tempo em que as pessoas anseiam por propósito, mas o buscam em eventos extraordinários, viagens, conquistas ou validações externas. Esquecemos que o verdadeiro sentido da vida pode — e deve — nascer da rotina. Na perspectiva da filosofia clássica e da fé cristã católica, descobrir o “para quê” da nossa existência é essencial para uma vida plena e feliz.
Neste artigo do Blog Disruptor de Vidas, refletiremos sobre como encontrar propósito mesmo nas tarefas simples do cotidiano, guiados por dois mestres: Aristóteles, o filósofo da virtude, e Jesus Cristo, o Deus encarnado no cotidiano.
A busca eterna pelo sentido: uma sede da alma
A inquietação que sentimos ao acordar e nos perguntarmos “o que estou fazendo da minha vida?” não é um acaso psicológico. É o grito da alma humana por sentido. Viktor Frankl, psiquiatra e fundador da Logoterapia, dizia que “a principal motivação do homem é a busca de um sentido para a sua vida”. Ele observou isso nos campos de concentração: aqueles que tinham um propósito, mesmo que mínimo, conseguiam sobreviver ao horror com mais força interior.
Na nossa realidade moderna, embora estejamos longe de tragédias como aquelas, muitos vivem uma rotina emocionalmente desnutrida: trabalho mecânico, relações superficiais, fé enfraquecida. A consequência? Ansiedade, burnout, apatia espiritual e existencial.
Aristóteles: o hábito como caminho da excelência
Aristóteles ensinava que “nós somos aquilo que fazemos repetidamente. A excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito.” Isso nos abre uma janela: a rotina não é inimiga do propósito, mas seu berço. É no cotidiano que formamos nossa alma, cultivamos virtudes e nos realizamos como seres racionais e espirituais.
Para o filósofo grego, a vida boa (eudaimonia) era atingida quando exercitamos virtudes como a justiça, a temperança, a coragem — tudo isso em equilíbrio. E onde essas virtudes se manifestam? No modo como tratamos os outros no trânsito, no cuidado com o lar, no zelo pelo trabalho, na forma como ouvimos o próximo.
A filosofia de Aristóteles nos ensina que o propósito não precisa ser épico para ser autêntico. Ele nasce da coerência entre o que fazemos e o que acreditamos ser bom, justo e belo.
Jesus Cristo: o Deus que se fez rotina

O que Aristóteles vislumbrou pela razão, Jesus revelou com a vida. O Filho de Deus não escolheu nascer num palácio, mas numa manjedoura. Não viveu nos templos, mas nas casas, nos caminhos empoeirados da Galileia. Trabalhou com as mãos, viveu entre pessoas comuns e valorizou o invisível aos olhos humanos.
A maior parte da vida de Jesus foi vivida no silêncio de Nazaré — anos inteiros de rotina escondida, trabalho simples, oração doméstica. O Evangelho praticamente silencia sobre essa etapa, e esse silêncio é profundamente eloquente. Ensina que Deus está também no ordinário, e que viver com propósito não é fazer coisas grandes, mas fazer o que é necessário com grande amor.
Santa Teresinha do Menino Jesus, doutora da Igreja, compreendeu isso de forma sublime. Ela dizia: “Quero encontrar o Céu fazendo a vontade de Deus em todas as coisas pequenas.”
Psicologia da rotina: o propósito como remédio à ansiedade
O psiquismo humano busca ordem, direção e sentido. A falta de propósito claro, segundo a psicologia positiva, está diretamente ligada ao aumento da ansiedade, desânimo e até quadros depressivos. Pessoas que vivem apenas em “modo de sobrevivência” têm mais dificuldade em manter relações saudáveis, concentração e autoestima.
Ter um propósito diário — por menor que seja — reorganiza a mente. Ele dá direção, reduz a dispersão e fortalece o senso de identidade.
Na fé cristã, esse propósito não se limita ao “fazer”. Vai além: trata-se de “ser” no coração de Deus. Santo Inácio de Loyola ensinava: “O homem foi criado para louvar, reverenciar e servir a Deus nosso Senhor, e assim salvar sua alma.”
Como encontrar esse propósito na sua rotina?
Aqui vão cinco passos práticos e espiritualmente enraizados:
1. Acorde com intenção
Antes de pegar o celular, faça uma breve oração: “Senhor, que eu viva este dia com sentido e fidelidade.” Estabeleça uma pequena meta que você sabe que fará o bem a alguém.
2. Reinterprete suas tarefas
Não veja sua rotina como fardo. Veja como serviço. Um prato lavado pode ser um ato de amor. Um relatório bem feito, uma entrega a Deus.
3. Exercite a gratidão concreta
Anote, ao final do dia, três ações que deram sentido à sua jornada — mesmo que pequenas.
4. Busque coerência
Não viva dividido. Faça o que está de acordo com seus valores cristãos. Isso trará paz interior.
5. Medite com a Palavra
Reserve 10 minutos para ler e ruminar o Evangelho. A Palavra ilumina o sentido das pequenas coisas.

Conclusão: propósito é presença
A chave para uma vida com propósito não está em encontrar uma grande missão “lá fora”, mas em transformar o aqui e agora num espaço de plenitude e oferta.
Como disse São João Paulo II: “A vida não é uma simples passagem, mas uma missão.”
Entre Aristóteles e Cristo, entre a filosofia e a fé, encontramos a verdade de que viver bem é viver com sentido. E sentido se encontra quando oferecemos, com amor, a nossa rotina a Deus.