A liturgia desta quarta-feira pascal nos convida a mergulhar profundamente no mistério do amor redentor de Deus. A Primeira Leitura (At 5,17-26) narra a ousadia dos apóstolos ao anunciar o nome de Jesus, mesmo após serem presos. No Evangelho (Jo 3,16-21), somos lembrados do fundamento de nossa fé: “Deus amou tanto o mundo que entregou seu Filho unigênito…”

Neste tempo pascal, somos chamados a refletir: O que seria de nós sem o sacrifício de Cristo? O mundo está imerso em dores, contradições e sombras, mas a cruz é o ponto de virada. É no madeiro que encontramos o ponto máximo do amor e da justiça divina, pois ali, Deus não apenas revela sua glória, mas oferece redenção a todos que creem.
A liberdade que vem do Alto
Os apóstolos, ao serem libertos da prisão por um anjo, não fogem. Pelo contrário, voltam ao Templo para continuar anunciando “este modo de viver” (At 5,20). Qual é esse modo de viver? A vida nova que brota do encontro com o Ressuscitado. Esse é o estilo de vida cristão: testemunhar a verdade mesmo diante da perseguição.
Quantas vezes também nós estamos “presos” pelos medos, traumas ou pecados do passado. Mas quando deixamos o Espírito agir, Ele abre as portas, desfaz as correntes e nos impulsiona a viver como filhos da luz.
Santo Irineu dizia: “A glória de Deus é o homem vivo, e a vida do homem é a visão de Deus.” Ou seja, a nossa vida plena está em vivermos livres no Espírito e não escondidos nas trevas do medo e da omissão.
A luz que denuncia e salva
O Evangelho de João nos mostra o grande paradoxo da fé: a luz veio ao mundo, mas os homens preferiram as trevas (Jo 3,19). A verdade é que muitos têm medo da luz porque ela revela o que está escondido. Mas a proposta de Jesus não é expor para condenar, é revelar para salvar.
A cruz é o julgamento definitivo do mundo. Cristo não veio condenar, mas salvar. No entanto, essa salvação exige decisão. “Quem nele crê não é condenado, mas quem não crê já está condenado.” (Jo 3,18). A fé não é neutra. É uma resposta concreta a uma proposta de amor.
Um Reino que não se abala
Ao unirmos essa liturgia com o trecho do livro “A Luta de Cada Dia” baseado em Hebreus 12, vemos a exortação para que não rejeitemos aquele que fala do céu. O autor nos lembra que Deus não é apenas bondade inofensiva. Ele é fogo devorador. Por isso, devemos oferecer a Ele um culto agradável com temor e respeito.
Esse temor não é medo paralisante, mas reverência consciente. Santo Afonso de Ligório dizia: “Quem ama a Deus teme ofendê-Lo, porque o amor verdadeiro é zeloso.”
Nas palavras da carta aos Hebreus: “Ainda uma vez por todas moverei não só a terra, mas também o céu” (Hb 12,26). Ou seja, tudo o que é frágil e passageiro será abalado. O que permanecerá é aquilo que é eterno: a fé, a esperança e o amor.
Aplicações práticas para a vida
- Não fuja da Luz: Em vez de temer o julgamento da luz, abrace a verdade que liberta. A confissão e a oração são meios concretos de se colocar diante da luz que cura.
- Cultive uma fé corajosa: Como os apóstolos, anuncie a verdade com ousadia. Mesmo se for rejeitado ou ridicularizado, saiba que o Espírito Santo é quem dá força.
- Não brinque com a graça: Como alertado no texto de Hebreus, não sejamos como Esaú, que trocou sua bênção por um prato de comida. Muitos ainda hoje trocam sua vocação eterna por prazeres momentâneos.
- Permita-se nascer da luz: Quem vive na verdade se aproxima da luz. Isso exige esforço diário, decisões pequenas, mas contínuas que moldam o caráter de Cristo em nós.
- Reze com gratidão: Agradeça todos os dias por ter sido alcançado pela salvação em Jesus. O simples fato de crer já é um dom imenso. Não desperdice esse presente.
Conclusão

Como dizia São João da Cruz: “No entardecer da vida, seremos julgados pelo amor.” O amor de Deus não é uma teoria, mas uma realidade encarnada na cruz. Ele nos alcança, nos liberta, nos envia. Que possamos escolher a luz, ainda que ela revele nossas fragilidades. Pois é justamente aí que Cristo nos cura, nos fortalece e nos envia como testemunhas.